Errar é humano. Eu tenho ali ao lado, neste blog uma nota: "Se detectar um erro, avise-me. Eu ainda sou humano."
Há erros que custam vidas. E há erros que não são admitidos por teimosia, burrice, orgulho... etc.
No segundo ano, segundo semestre da minha licenciatura, eu tive uma cadeira de Análise Matemática IV .
Um dos primeiros assuntos da cadeira foi, o teorema do ponto fixo de Banach.
O conceito de ponto fixo não era novo, já o tínhamos visto em Análise Numérica.
Um ponto fixo $a$ de uma função $f$ é um ponto que pertence simultaneamente ao domínio e ao contradomínio da função, e tal que $$f(a)=a$$
ou seja, um ponto que não é alterado pela função.
Por exemplo, $-1,0$ e $1$ são pontos fixos da função de domínio $\R$ cuja expressão algébrica é $$f(x)=x^3$$.
No caso de funções reais de variável real, até se conseguem detectar visualmente: São simultâneamente a abcissa e a ordenada da intersecção do gráfico da função $f$ com a recta de equação $$y=x$$
Os teoremas de ponto fixo em Matemática são úteis para provar a existência de objectos, que podem nem ser números.
O teorema do ponto fixo de Banach é útil porque além de garantir a existência, até nos dá uma forma constructiva de obter um ponto fixo.
Logo na primeira aula prática da cadeira a professora decidiu rever o conceito como se nunca o tivessemos visto, e enquanto eu me controlava para não bocejar, nos exemplos dela saiu este:
"O cosseno não tem ponto fixo."
Usou uns argumentos facilmente refutáveis, até porque estava a contradizer tanto o professor da teórica que usou explicitamente esse exemplo, como o de Análise Numérica, que também o usou.
Basicamente estava a dizer que como não encontrava um número racional ou uma fracção racional de $\pi$ , que satisfizessem $\cos x=x$, não existiam pontos fixos para o cosseno.
Mas que afirmação rigorosa!
Eu olhei para a equação.
"Eu consigo provar que existe, pelo teorema de Bolzano, e até pelo teorema da cadeira, o teorema do ponto fixo de Banach.",
Mas isto é ser estúpido! Com um desenho, que obviamente, não deve ser usado como prova rigorosa, consegue-se ver que o ponto existe em $\R$.
E mostrei-lhe, na altura, a minha casio CFX 9800G com o gráfico da função cosseno a intersectar o gráfico de $y=x$
Saíu-lhe da boca uma frase tão infeliz que me fez perceber que o problema era bem mais grave, a mulher não fazia mesmo a mínima ideia do que dizia.
Não foi o erro mais grave que a mulher cometeu à minha frente. A certa altura, depois de uma série deles, percebi que aquelas aulas eram uma perda de tempo, e que em casa, com os meus livros, eu era muito mais produtivo. Deixei de ir às aulas.
Portanto, hoje em dia, a história de obrigar um aluno, adulto, a aparecer a 75% das aulas teórico-práticas é mesmo muito discutível, e tem muita má fé à mistura.
Eu tive a nota mais alta em Análise IV.
Passei a chamar, sarcasticamente, ao único ponto fixo da função cosseno, "o ponto inexistente". Pá, já chamamos 'imaginários' a coisas que existem. É só mais um nome inadequado.
A mulher nunca se corrigiu.
A gravidade dos erros, fez com que eu nunca os tenha esquecido...
As imagens do post de hoje foram obtidas por captura numa Casio fx-CG 20.
Eu nunca escreveria "interceção"
PS: são sejam idiotas, aquele $0.739085332$ não é o ponto fixo, é um valor racional, aproximado do ponto fixo real, que existe... e deixo ao leitor interessado e sem nada melhor para fazer, provar a sua existência.
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